sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Relatório aponta violações de direitos humanos em barragens

Atingidos por barragens de todo Brasil aguardam a aprovação pelo CDDPH - Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (órgão ligado ao Ministério da Justiça) do relatório final da Comissão Especial criada para acompanhar casos de violações de direitos humanos em hidrelétricas e propor medidas para reparar as mesmas.

O relatório foi concluído este ano e será votado pelo CDDPH, em reunião ordinária, no dia 22/11, às 14h, em Campo Grande (MS). A reunião terá a presença do Ministro Chefe da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, dos integrantes do Conselho, da Comissão Especial e de representantes do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens).

A Comissão Especial acompanhou denúncias feitas pelo MAB e encaminhadas ao CDDPH de ocorrências de violações de direitos humanos decorrentes da implementação de barragens no país, realizando um levantamento empírico desses casos. O relatório final apresenta propostas no que concerne à prevenção, avaliação e mitigação dos impactos sociais e ambientais da implementação dessas barragens, bem como a preservação e reparação dos direitos das populações atingidas.

A comissão recebeu denúncias de violação de direitos humanos em 74 projetos e selecionou sete casos para acompanhamento, contemplando as cinco regiões do país: Açude Acauã (PB); PCH’s Emboque e Fumaça (MG); e UHE’s Cana Brava (GO), Foz do Chapecó (RS/SC), Aimorés (MG) e Tucuruí (PA).

Importância do relatório

O MAB espera que a aprovação do relatório ajude na reparação dos impactos sofridos pela população afetada por essas sete barragens e na criação de mecanismos, instituições governamentais, programas e legislação que beneficiem todos os atingidos do país. Um dos resultados do relatório é o Decreto nº 7.342 da Presidência da República, de 26 de outubro de 2010, que institui o cadastro socioeconômico para identificação, qualificação e registro público da população atingida por barragens. A instituição do cadastro é uma reivindicação antiga do MAB e uma das recomendações da Comissão Especial.

Em função da composição da Comissão, da pluralidade de casos analisados, da magnitude do setor elétrico brasileiro e do seu objeto de investigação, o relatório é considerado um dos principais documentos sobre o tema, depois dos trabalhos da Comissão Mundial de Barragens (www.dams.org).

Histórico da Comissão Especial

30 de março de 2006 – em sessão ordinária do CDDPH, no Rio de Janeiro, o MAB apresentou denúncias das violações de direitos humanos e criminalização de defensores destes.

26 de agosto de 2006 - O Conselho instituiu uma comissão especial, através da resolução 26, para verificar as denúncias e apresentar propostas para prevenir novas violações.

Entre 2006-2009 - a Comissão Especial realizou visitas às regiões, audiência públicas, colheu depoimentos e requisitou documentos aos atingidos, órgãos públicos e empresas.

Contato:

(11) 3392-2660 begin_of_the_skype_highlighting (11) 3392-2660

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Participe do abração global criativo Viva Amazônia Viva !

O V Fórum Social Pan-Amazônico (FSPA) acontecerá nos dias 25-29 de Novembro de 2010 em Santarém, Pará, no norte do Brasil, para inspirar os povos e os governos dos nove países da região Pan-Amazônica a abraçarem uma Amazônia livre, protegida e sustentável.
Desde 2002, o Fórum vem desenvolvendo um espaço aberto, plural, não-governamental e não-partidário, que estimula o debate, a formulação de propostas e a articulação entre organizações e movimentos sociais para atuar local e internacionalmente pela construção de um mundo solidário, democrático e justo. Nessa 5ª edição, porém, o Fórum ganha uma urgência mundial e gritante diante do projeto federal de construir a ‘Belo Monte’, a terceira maior usina hidrelétrica de todo o planeta, em 2011, na região de Altamira no Pará. Além de causar problemas culturais, sociais, econômicos e ambientais gravíssimos, a construção e operação da usina pode vir a contaminar o maior lençol subterrâneo de água potável do mundo.
‘Belo Monte’ pretende desviar a água de 100 km do Rio Xingu, deixando indígenas, ribeirinhos, pescadores, garimpeiros e todos que utilizam o rio, sem o principal meio de locomoção e de sustento. Danificaria a vida de mais de 340.000 habitantes, incluindo 24 etnias de 30 terras indígenas; e inundaria uma área de 668 km2, causando escassez de pesca, desmatamento, migração de não-índios, pressão fundiária, prostituição infanto-juvenil, tráfico e dependência de drogas; e epidemias como dengue e malária.
Além dessa catástrofe, estão planejadas hidreletricas nos rios Tapajós (Pará), Madeira (Rondônia) e Teles-Pires (Mato Grosso), somando nos próximos dez anos mais 300 hidrelétricas na Amazônia. Por isso, convidamos artístas e arteducadores em cada canto a contribuir com uma ação criativa para proteger a água potável do mundo.
Seu grupo pode criar uma ação artística (ou dedicar uma já existente) sobre ‘Água Viva’ para manifestar seu envolvimento na busca de uma vida planetária sustentável. Apresente sua ação teatral, musical, visual, poética ou de dança, na escola, na comunidade, na rua, no quarto, em qualquer lugar, e depois posta um fragmento de 2 minutos no YouTube, no dia 27 de Novembro, com título: Viva Amazônia Viva!
Seu grupo também pode participar virtualmente nos dias 26 e 28 de novembro entre 14h-18h (horário do norte do Brasil) num diálogo sobre ‘cultura e educação transformadoras’ – como as artes de música, imagem, teatro, dança, vídeo e literatura (nossas linguagens humanas), podem cultivar pedagogias, éticas, economias cooperativas e comunidades sustentáveis.
Mais informação sobre esse abração criativo global e diálogo virtual:
Dan Baron (Transformance/Rede Brasileira de Arteducadores – ABRA), Déa Melo (Manamani/ABRA), Luana Vilutis (ABRA), via: vivamazoniaviva@gmail.com
Favor, visite www.xinguvivo.org.br para conhecer o Movimento Xingu Vivo para Sempre, principal coalizão contra a hidrelétrica de ‘Belo Monte’.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

OEA pode recomendar a suspensão de Belo Monte

Entidades enviaram hoje (11) documento que denuncia violações a tratados internacionais no projeto e ameaças a comunidades indígenas e ribeirinhas do rio Xingu; OEA exigirá explicações do Estado e pode solicitar impedimento das obras

A Organização dos Estados Americanos (OEA) recebeu hoje (quinta-feira, 11) um documento que denuncia as ilegalidades no processo de licitação e os impactos às comunidades indígenas e ribeirinhas que serão atingidas pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Assinada pelo Movimento Xingu Vivo Para Sempre e por outras organizações representantes das comunidades – Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Prelazia do Xingu, Sociedade Paraense de Direitos Humanos (SDDH), Justiça Global e Associação Interamericana de Defesa do Ambiente (AIDA) –, e elaborada com a participação de mais de vinte organizações e movimentos sociais apoiadores, a petição solicita em caráter de urgência a concessão de medidas cautelares* para a suspensão do processo de licenciamento ambiental do projeto.

Na denúncia, as entidades afirmam que o Brasil está violando tratados internacionais ao ignorar direitos fundamentais das comunidades Arroz Cru, Arara da Volta Grande, Juruna do Km 17 e Ramal das Penas, todas à beira do rio Xingu. O deslocamento forçado – sem consulta prévia e consentimento livre das comunidades – e as ameaças à segurança alimentar, ao meio ambiente e ao acesso a água potável são alguns dos problemas graves do projeto ressaltados no documento. As organizações lembram que em 2009 a OEA concedeu medidas cautelares que determinaram a suspensão das obras de construção da usina hidrelétrica Chan 75, no Panamá, devido ao deslocamento forçado de comunidades indígenas locais. Outros casos da América Latina também são citados.

Baseadas em pareceres de órgãos estatais – como o IBAMA e o Ministério Público Federal – e em laudos técnicos de especialistas, as entidades afirmam ainda que a construção de Belo Monte ocasionaria o aumento de doenças e da pobreza, além de causar o surgimento de fluxos migratórios desordenados que sobrecarregariam os sistemas de saúde, educação e segurança pública da região. “Apesar da gravidade e irreversibilidade dos impactos da obra para as comunidades locais, não foram realizadas as medidas adequadas para garantir a proteção dos direitos e do meio ambiente”, conclui o texto do documento.

* Como é o trâmite na OEA?

O Governo Federal afirma que as obras de construção de Belo Monte devem ser iniciadas em breve, e que, apesar das últimas recomendações do MPF (aqui e aqui), a licença de instalação do IBAMA pode sair nas próximas semanas. Por se tratar de pedido urgente de medidas cautelares – efetuado quando há risco iminente de violação de direitos humanos –, a OEA, através da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), exigirá esclarecimentos imediatos do Estado brasileiro e, em seguida, emitirá sua decisão. Caso o pedido de medidas cautelares seja aprovado, cabe ao Governo Federal o cumprimento das exigências determinadas pela CIDH em sua resolução.

Fonte: Assessoria de Co0municação do Movimento Xingu Vivo para Sempre

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

MPF recomenda ao Ibama que não fragmente licenças para Belo Monte

Procuradores enviaram documento hoje avisando que não existe licença parcial nesse momento. Condicionantes da licença prévia têm que ser cumpridas antes de nova autorização.

O Ministério Público Federal enviou hoje ao presidente do Ibama, Abelardo Bayma de Azevedo, uma recomendação para que não emita nova licença ambiental para a usina hidrelétrica de Belo Monte enquanto não estiverem resolvidas as questões pendentes da Licença Prévia.

“Se abstenha de emitir qualquer licença, em especial a de Instalação, prévia ou definitiva, do empreendimento denominado AHE Belo Monte, enquanto as questões relativas às condicionantes da Licença Prévia 342/2010 não forem definitivamente resolvidas de acordo com o previsto.

Na Licença Prévia, que autorizou o leilão da usina em abril desse ano, os técnicos do Ibama elencaram 40 condicionantes – exigências prévias – que deveriam ser cumpridas antes da emissão de novas autorizações. “O MPF constatou que, até agora, a maioria das condicionantes encontra-se, se não no marco zero, muito aquém do previsto”, dizem os procuradores, para acrescentar em seguida que o cenário “é de total incerteza sobre o cumprimento das condicionantes e sobre os danos que com isso serão causados”.

O MPF alerta o Ibama de que o direito ambiental é regido pelo princípio da precaução, que exige cuidados prévios em caso de possibilidade de danos irreversíveis. “É inadmissível juridicamente a expedição dessa nova licença, porque relegaria a decisão por cumprir as condicionantes para um momento posterior”, diz a recomendação.

Na recomendação ao Ibama, os procuradores da República que atuam em Altamira, Cláudio Terre do Amaral e Bruno Gütschow lembram que “não existe no ordenamento jurídico brasileiro o instituto da licença parcial de instalação (ou qualquer outro instrumento com outro nome) que permita que se inicie a implementação de um empreendimento com impactos de grandeza regional ou nacional em caráter precário”.

Pelas leis brasileiras, um empreendimento pode obter três licenças ambientais – a Prévia, que estabelece a viabilidade do projeto e sob que condições; a de Instalação que, cumpridas as condições de viabilidade, permite o início da obra em si; e, após as obras, a Licença de Operação, que autoriza o funcionamento.

Por isso, o MPF registra na recomendação ao Ibama que, pelo princípio constitucional da legalidade, a administração pública e os agentes públicos só podem editar atos administrativos de acordo com o que está previsto na legislação.

No entanto, existe um caso de obra no setor elétrico que obteve licença parcial para instalação de canteiros, sem respeito à legislação: a obra de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia. O caso das usinas do rio Madeira está sub judice, e há temor de que o mesmo tipo de burla se repita em Belo Monte.

Ministério Público Federal no Pará
Assessoria de Comunicação
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quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Complexo Hidrelétrico Teles Pires e Terras Indígenas

Por Telma Monteiro*
O projeto Teles Pires, na verdade, é um grande complexo hidrelétrico. Se for concretizado, poderá se transformar, em menos de cinquenta anos, num fóssil jovem em meio a um deserto induzido no coração da Amazônia.
O rio Teles Pires está nos planos governamentais desde os anos 1980 quando foi feito o inventário da bacia hidrográfica. Do projeto inicial que permaneceu esquecido até 2001, já constavam os seis aproveitamentos hidrelétricos. Em 2005 um consórcio formado pelas estatais Eletrobrás, Furnas e Eletronorte resolveu desengavetá-lo e manter os planos para as seis hidrelétricas, das quais cinco seriam no rio Teles Pires e uma na foz do rio Apiacás, um de seus afluentes.
Apesar da proposta de se construir cinco usinas no rio Teles Pires - São Manoel (747 MW), Teles Pires (1820 MW), Colíder (342 MW), Sinop (461 MW), Magessi (53 MW) - Foz do Apiacás no rio Apiacás (275 MW), não foram realizados estudos dos impactos sinérgicos na região. Um Estudo de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) da hidrelétrica Teles Pires foi aceito, no mês passado (outubro, 2010) pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama). As audiências públicas foram marcadas e já são objeto de questionamento por parte do Ministério Público.
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) tem como prática, nos processos de licenciamento de hidrelétricas na Amazônia, muita pressa em obter as licenças ambientais. Até dezembro a usina Teles Pires deverá ser leiloada, conforme proclamam os arautos do setor elétrico. A Licença Prévia (LP) do Ibama, se for concedida, vai satisfazer mais uma praxe inventada no bojo do Novo Modelo Institucional de Energia (Lei nº 10 847/10848 de 2004) construído por Dilma Rousseff e Furnas a partir de 2003 quando ela assumiu o Ministério de Minas e Energia (MME).
Na análise do EIA da usina de Teles Pires é possível ter uma idéia do tamanho do problema que afetará duramente a região situada no trecho onde começa uma seqüência de cachoeiras chamadas Sete Quedas, no baixo curso do rio Teles Pires. Geograficamente essa usina seria construida exatamente na divisa entre dois grandes municípios em dois estados: Jacareacanga, no Pará e Paranaíta, no Mato Grosso.
O reservatório está planejado para alagar 70 quilômentros ao longo do rio Teles Pires. A primeira metade, a montante (rio acima) da barragem, ocuparia um trecho mais estreito do rio engolindo suas vertentes, transpondo um declive acentuado e lindamente encachoeirado. Na outra metade, o leito é espraiado, pontilhado de muitas ilhas e bancos de areia. Se o projeto fosse viabilizado toda essa riqueza natural ficaria submersa.
A usina de Teles Pires, no entanto, não chegaria aos 50 anos de vida útil, se for levado em conta o agravamento das características hidrológicas da região. As mudanças climáticas, os períodos cada vez mais intensos de regimes de cheias e vazantes, o aumento do aporte de sedimentos devido à ocupação a montante (rio acima em direção às nascentes), poderiam reduzir ainda mais o tempo de geração comercial da usina. Esse projeto anacrônico, se concretizado, poderá se transformar, em menos de cinquenta anos, num fóssil jovem em meio a um deserto induzido no coração da Amazônia.
No projeto de barramento do rio Teles Pires está prevista a construção de três eclusas que, segundo os estudos ambientais, viabilizaria uma hidrovia no trecho que vai do município de Sinop até a foz do Teles Pires no rio Tapajós. Então, os “obstáculos” naturais formados no trecho encachoeirado das Sete Quedas, imediatamente a jusante da barragem da usina de Teles Pires, teriam que ser removidos, coisa que não está explicada no EIA.
A única forma possível de viabilizar a navegação no trecho encaichoeirado das Sete Quedas seria, é óbvio, criar outra usina com um reservatório para deixar submersos e transpor os “obstáculos”, que alcançaria a barragem de Teles Pires e justificaria a construção das três eclusas planejadas. Esse projeto está, sutilmente, sendo licenciado pelo Ibama, mas sem nenhum alarde: é a hidrelétrica São Manoel, cuja barragem ficaria cerca de 40 quilômetros a jusante (rio abaixo) da barragem da UHE Teles Pires.
O plano de concretizar o corredor de transportes representado pelo projeto da Hidrovia Tapajós-Teles Pires teria o objetivo de escoar os grãos produzidos na região norte do estado de Mato Grosso. Antes, porém, seria preciso tornar navegável o trecho encachoeirado do rio Teles Pires até a foz do rio Apiacás, destruindo as ilhas e as Sete Quedas.
Mas esses planos não param por aí. Na mesma região onde está planejada a hidrelétrica São Manoel no limite da foz do rio Apiacás no Teles Pires, outra usina, a de Foz do Apiacás, também está sendo licenciada. O mais surpreendente é que foi elaborado um único estudo do componente indígena para as duas usinas – São Manoel e Foz do Apiacás - com a justificativa de que elas estariam praticamente juntas! Essa informação está explícita nos estudos do processo de licenciamento da hidrelétrica São Manoel, que tramita simultaneamente aos outros. Para os desenvolvedores dos estudos permanece a certeza de que usinas em sequência – duas no rio Teles Pires e outra na foz do rio dos Apiacás - na mesma bacia hidrográfica não merecem estudos separados do componente indígena. A Fundação Nacional do Índio (FUNAI) se manifestou quanto a essa arbitrariedade?
As hidrelétricas São Manoel e Foz do Apiacás estão imediatamente a jusante, exatamente no limite da divisa da Terra Indígena (TI) Kayabi, que foi considerada nos estudos como Área de Influência Indireta (AII). As empresas que elaboraram o EIA – Leme Engenharia da Tractebel/GDF Suez e Concremat – de Teles Pires tomaram a iniciativa de considerar que os impactos decorrentes da construção dessas usinas, além de não afetarem diretamente a TI Kayabi, também não atingiriam duas Unidades de Conservação - a Reserva Estadual de pesca Esportiva, no Pará e o Parque Estadual do Cristalino, em Mato Grosso.
Além da TI Kayabi, a TI Munduruku, mais a jusante, também seria afetada pelas usinas Teles Pires, São Manoel e Foz do Apiacás, assim como 16 importantes sítios arqueológicos. Os municípios de Jacareacanga (PA), Paranaíta (MT) e Alta Floresta (MT) foram considerados como Área de Influência Indireta (AII).
Outro dado importante se refere à logística pensada para transporte de veículos, materiais, trabalhadores e equipamentos para esse lugar remoto da Amazônia, entre os estados do Pará e Mato Grosso. Teriam que ser percorridos cerca de mil e cem quilômetros desde Cuiabá, dos quais mais 600 através da BR 163, e o resto por vias sem qualquer possibilidade de acesso razoável.
Uma das informações dos estudos ambientais que causa um verdadeiro horror é que 40 mil pessoas migrariam para a região no pico das obras, apenas da usina Teles Pires. Esse contingente representaria outra hecatombe, pois o município de Alta Floresta (MT) tem 37 mil habitantes e o baixo curso do Teles Pires tem 180 mil habitantes.
No município de Jacareacanga (PA), 59% são terras indígenas. A área rural que seria afetada pela usina de Teles Pires tem 66 mil quilômetros quadrados, 20 mil habitantes, é de difícil acesso, com vegetação nativa e é ocupada por terras indígenas. O sistema de transmissão da energia desse complexo hidrelétrico está previsto para ter cerca de mil quilômetros e um corredor de 20 quilômetros de largura.
As empresas que elaboraram os estudos ambientais das hidrelétricas Teles Pires e São Manoel, consideraram também que a proximidade entre elas (distância entre eixos de aproximadamente 40 km) permitiria o mesmo diagnóstico para o meio socioeconômico, com os mesmos elementos. A EPE já está distribuindo na região o RIMA de Teles Pires e o Estudo do Componente Indígena das hidrelétricas São Manoel e Foz do Apiacás para marcar as audiências públicas. Isso quer dizer que a EPE e o Ibama podem estar trabalhando com a estratégia de realizar audiências públicas para os três aproveitamentos; mas o EIA/RIMA aceito pelo Ibama, até agora, diz respeito apenas à hidrelétrica Teles Pires e não às outras duas.
A Área de Abrangência Regional (AAR) objeto dos estudos da usina Teles Pires compreende 33 municípios no estado de Mato Grosso com um conjunto de estabelecimentos rurais e área de assentamento e dois dos maiores municípios do estado do Pará.
Para o Governo Federal, a construção de todo esse aparato hidrelétrico é necessária para atender o aumento do consumo de energia na região Norte devido à instalação de novas indústrias eletrointensivas ligadas à mineração. Esse consumo, segundo dados do EIA do projeto Teles Pires, teria crescido de 6,3% para 8,6%.
Está previsto para os próximos 25 anos, segundo o Plano Nacional de Energia (PNE) 2030, o incremento de mais 88 mil MW de geração com hidrelétricas e de apenas quatro mil MW em geração eólica. Essa previsão tem como base apenas dados de crescimento de consumo e do déficit previsto para o Sudeste/Nordeste/ Centro-Oeste, Mato Grosso e Sul do Pará. Aí cabe perguntar sobre quais os critérios que subsidiaram o planejamento da Oferta Interna de Energia.
Já passou da hora de começar a discutir claramente o destino de toda essa energia planejada para os próximos 25 anos; de reivindicar incentivos para o desenvolvimento em escala econômica viável, de fontes realmente renováveis e limpas, como a eólica e a solar; de exigir programas de eficiência energética como rotina e acabar com as perdas nos sistemas de transmissão e distribuição.
O EIA/RIMA da hidrelétrica Teles Pires foi aceito pelo Ibama e audiências públicas são apenas mais uma praxe para legitimar todo o processo de licenciamento ambiental de empreendimentos na Amazônia. Na verdade, se pretende mesmo é “enfiar goela abaixo” da sociedade três novas hidrelétricas na Amazônia.
As comunidades da região, os povos indígenas, mesmo sem serem ouvidos, já estão sendo afetados apenas com o anúncio da possibilidade da construção dos projetos. A migração já está começando. Ao longo do reservatório de 70 quilômetros da hidrelétrica Teles Pires, estão situados grandes latifúndios voltados para a pecuária e plantação de grãos em plena Amazônia Legal. Há alguma relação entre esses grandes proprietários de terras e o projeto? E a questão das reservas de ouro? Atualmente estão em curso 37 processos minerários de ouro na Área Diretamente Afetada (ADA) pela usinaTeles Pires e três processos minerários para zinco, requeridos pela Votorantim, todos de 2009 – seria coincidência?


*Telma Monteiro
Coordenadora Energia
Kanindé - Associação de Defesa Etnoambiental
http://telmadmonteiro.blogspot.com/
https://twitter.com/TelmaMonteiro