Publicado em 29 de janeiro de 2013
Na última semana, a Norte Energia demoliu a casa da agricultora Maria do Socorro de Oliveira, de 69 anos, deixando a idosa, seus seis netos, um bisneto e um filho adotivo de poucos meses sem moradia. Dona Maria, proprietária de dois lotes (200 hectares) na região conhecida como Travessão do Cenec, onde cultiva 4,3 mil pés de cacau (além de banana, caju, laranja e outras frutas), foi desapropriada à revelia e o valor da terra, estipulado pela empresa em R$ 300 mil, foi depositado em juízo. A Justiça, no entanto, negou o acesso ao recurso.O caso de dona Maria é mais um dos graves problemas fundiários causados pelo avanço de Belo Monte na região de Altamira. Segundo a agricultora, a Norte Energia, responsável pela obra da hidrelétrica, realizou uma série de intervenções no travessão onde mora, abrindo uma estrada, derrubando sua cerca, retirando piçarro (substrato de solo para fazer estrada) sem autorização de sua área, e por fim sub-avaliou o valor de sua produção de cacau, argumentando que as plantas eram nativas e não tinham valor de mercado. “Meu cacau fica longe da casa em uma ribanceira, e eles falaram que é nativo e não vale nada, o que não é verdade. Tenho um certificado da Ceplac (Comissão Executiva de Planejamento da Lavoura Cacaueira) comprovando isso. Mas a Norte Energia disse que só pagava R$ 12 pelo pé de cacau, enquanto pros vizinhos pagou R$ 90. Então não aceitei os R$ 300 que eles queriam dar nas minhas terras”, explica.
A partir da negativa da agricultora de aceitar a oferta da empresa, a Defensoria Pública impetrou uma ação na Justiça pedindo a reavaliação da área. Imediatamente, a Norte Energia entrou com outra ação, com pedido de liminar, de desapropriação compulsória, aceita pela Justiça. Os R$ 300 mil foram depositados em juízo.
Novo recurso da Defensoria requereu então que a empresa fosse impedida de alterar a área antes da tramitação final das ações e da conclusão da nova vistoria, mas na última semana, aproveitando a ausência da agricultora, que estava em Altamira por questões de saúde, a empresa demoliu sua casa. “Quando cheguei na minha terra vi a casa toda destruída, minhas plantinhas jogadas, coisa mais triste. Agora não tenho pra onde ir”, diz dona Maria.
De acordo com a defensora pública Andréia Barreto, a destruição da casa e demais intervenções da empresa na terra da agricultora são extremamente graves porque podem interferir nos resultados nova vistoria, que aguarda apenas a liberação de verbas para o auditor. “Qualquer mudança nas benfeitorias ou na terra pode alterar o valor a ser recebido. Como exigir pagamento por uma casa que não está mais lá, que foi destruída?”, questiona a defensora, que enviou nova reclamação à Justiça Federal em Brasília esta semana.
Sem casa e sem dinheiro
Além de não ter onde morar com seus netos, dona Maria também foi impedida pela Justiça de sacar o dinheiro depositado em juízo em sua conta. Segundo a defensora Andréia Barreto, o juiz federal Sergio Wolney de Oliveira Guedes impediu o acesso ao recurso argumentando que a área da agricultora estaria em litígio, uma vez que a União ainda não teria regularizado seu imóvel, ocupado há 23 anos.
“Minha mãe era saudável, nunca teve problema de saúde, mas agora está com profunda depressão, pressão alta. Passa o dia chorando, ou dopada. Agora, ela está sem casa e sem dinheiro. O que será dela?”, questiona Ormazete de Oliveira, filha da agricultora.