quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Conjuntura da Política Indigenista: O Presidente Lula e os “entraves” de seus dois mandatos!

Os anseios dos povos indígenas e suas expectativas não foram atendidos no governo Lula. As demarcações de terras, dever do Estado, não se tornaram prioridade e muitos dos procedimentos demarcatórios se encontram paralisados. Poucas foram as terras regularizadas nos dois mandatos do presidente Lula: ele homologou apenas 88 terras, sendo que muitas delas tiveram os procedimentos iniciados em governos anteriores. O comentário é de Roberto Antonio Liebgott, Vice-Presidente do Conselho Indigenista Missionário – Cimi em artigo no portal do Cimi, 13-12-2010.
Eis o artigo.
Ao findar o segundo mandato do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se pode deixar de avaliá-lo quanto a sua política para os povos indígenas, bem como, em certa medida, compará-lo com outros governos que também desenvolveram ações indigenistas. Esta tentativa de análise e avaliação tem como objetivo apontar avanços e retrocessos da política realizada, ao longo de oito anos.

É bom salientar, até para estabelecer um parâmetro entre os diferentes governantes, que alguns dos que presidiram o Brasil nas últimas décadas foram concebidos no seio da ditadura militar, outros forjados no neoliberalismo ou, ainda, na social democracia. Nos últimos oito anos vivemos tempos de governo Lula que teve sua história de militância construída no movimento sindical, onde se refletia, na época, os ideais de esquerda.

Iniciamos a análise com uma breve retrospectiva, a partir de João Batista Figueiredo, general do Exército, que comandou o Brasil (1979 a 1985) numa época em que se discutia tanto nas ruas, quanto no parlamento, a transição do autoritarismo militar para o que acabou sendo denominado de uma “Nova República”. Período também em que se gestou a idéia de se convocar uma Assembléia Nacional Constituinte, com a finalidade de elaborar e aprovar uma nova Constituição. No governo do General Figueiredo se instalou no Brasil uma grave crise econômica. Foi o fim do “milagre brasileiro”, um tempo marcado pela política desenvolvimentista do regime militar. Naquele período também ocorreu a reabertura política e o fim do bipartidarismo. A partir de então foram criados vários partidos políticos, os que estavam na clandestinidade puderam expressar seus ideais e outros foram reestruturados. Neste contexto nasceu o Partido dos Trabalhadores (PT).

No tocante à questão indígena, o governo de Figueiredo teve consequências dramáticas: houve a propagação de epidemias e endemias que atingiram dezenas de povos na Amazônia, sendo que alguns deles sofreram risco de extinção, a exemplo dos Deni. A política de integração nacional desencadeou um processo intenso de invasões nas terras indígenas. Estradas e hidrelétricas foram projetadas e construídas rasgando e alagando as florestas da Amazônia. O incentivo à colonização sulista no Pará, Rondônia e Mato Grosso acelerou o processo de desmatamento. A concessão e instalação de grandes empresas de mineração ampliaram significativamente a devastação e a contaminação de lagos e rios. Em Roraima a terra Yanomami foi sendo paulatinamente invadida por garimpeiros. A perspectiva do Estado era a de “integrar os índios à comunhão nacional” e, para aqueles que resistissem ao processo assimilacionista, se projetava o extermínio através da expansão colonialista.

Já o presidente José Sarney governou o país por cinco anos (1985-1990), em função do falecimento de Tancredo Neves, eleito de forma indireta através de um Colégio Eleitoral (composto por Deputados Federais, Senadores e seis representantes de cada Assembléia Legislativa) em disputa com Paulo Maluf, no dia 15 de janeiro de 1985. Entre suas atribuições estava a de conduzir o processo de redemocratização, a de convocar a Assembléia Nacional Constituinte e promover eleições diretas para Presidência da República. Sob comando de Sarney o Brasil foi submetido ao colapso da economia, gerado em especial pelos altos índices de inflação que chegaram a 85% ao mês. Muitas áreas indígenas, em especial na Amazônia, foram tomadas por invasores (pescadores, madeireiros, garimpeiros, mineradoras). A Funai tornou-se reduto de servidores anti-indígenas e as políticas executadas tinham por finalidade a liberação das terras para a exploração mineral, madeireira e também para a implantação de núcleos de colonização. No período governado por Sarney a presença garimpeira na área Yanomami foi avassaladora: mais de 30 mil garimpeiros ocuparam a terra indígena com a conivência do Governo Federal e com apoio da Funai. Estima-se que mais de 2000 Yanomami morreram em decorrência de doenças provocadas pela invasão de suas terras.

Em 1988, com a promulgação da nova Constituição Federal, importantes avanços foram conquistados no que tange aos direitos indígenas, especialmente há que se destacar que a nova Carta Magna rompe com a perspectiva integracionista, garante o direito à diferença e determina que as terras sejam todas demarcadas (Art. 231, 232, 210, 215).

Depois de um mandato de cinco anos do presidente Sarney, a população brasileira elegeu Fernando Collor de Mello (1990 a 1992), em disputa com o candidato Lula, do Partido dos Trabalhadores. Ao assumir, Collor interferiu na economia do país, através de medidas extremas: o congelamento e o bloqueio das cadernetas de poupança da população foram as que mais interferiram na vida dos brasileiros.

Na política indigenista, ele criou decretos estabelecendo competências aos Ministérios da Justiça, da Saúde, da Educação e da Agricultura para que estes promovessem ações e serviços aos povos indígenas. Pressionado pela realização da ECO92 no Brasil, Collor determinou que a área Yanomami fosse demarcada. Outras terras também passaram por estudos antropológicos e posteriormente foram consideradas como sendo de ocupação tradicional indígena, de modo especial na Amazônia. Em pouco mais de dois anos de seu conturbado governo, interrompido por um processo de impeachment por corrupção, Collor homologou 108 terras indígenas.

Itamar Franco, vice de Collor, assumiu a Presidência da República e governou o país entre os anos de 1992 a 1994. Naquele período foi convocada a Segunda Conferência Nacional de Saúde Indígena, que estabeleceu as diretrizes e parâmetros para uma nova política de saúde. O governo de Itamar Franco homologou, em dois anos, 20 terras indígenas.

O segundo presidente eleito pelo voto popular foi Fernando Henrique Cardoso, em disputa com Lula. FHC consolidou a candidatura e se elegeu por dois mandatos (1994 a 2002), em função do Plano Real, criado para combater a inflação. Na era FHC a questão indígena passou a ter maior visibilidade, não em função dos direitos conquistados ou pela necessidade de estruturar políticas adequadas para eles, e sim por conta dos interesses econômicos que insidiam sobre as terras indígenas.

No governo de FHC foi revogado o Decreto 22/91 que regulamentava o procedimento de demarcação de terras, criado por Collor. Em seu lugar editou-se o Decreto 1775/96, que teve por objetivo possibilitar a ingerência direta dos opositores aos direitos indígenas nas fases iniciais dos procedimentos de demarcação, através do “direito ao contraditório”. Com essa estratégia, dezenas de demarcações de terras acabaram questionadas, mesmo depois de terem sido concluídos os seus estudos de identificação, delimitação e comprovação da ocupação tradicional indígena. FHC introduziu, no âmbito das políticas públicas, a terceirização dos serviços, transformando a assistência de saúde e educação num espaço de loteamentos políticos a parlamentares, partidos, ONGs e prefeituras. Nos oito anos de governo, FHC homologou 147 terras indígenas.

O presidente Lula, depois de quatro disputas presidenciais, foi eleito em 2002 e reeleito em 2006. Lula consolidou sua candidatura como opositor das políticas neoliberais, do imperialismo norte-americano e com a promessa de que moralizaria a administração pública, afetada por constantes denúncias de corrupção. A candidatura de Lula expressava o anseio popular por mudanças e sobre a qual recaiam a confiança e as esperanças dos pobres, que acreditavam ser possível um governo desenvolver políticas de geração de empregos, assistência digna, educação de qualidade, segurança, reforma agrária, redistribuição de renda.

Os povos indígenas confiaram que haveria um governo comprometido com suas lutas e reivindicações e, por conseguinte, as suas terras seriam demarcadas e que se estruturariam políticas tendo em vista assistência diferenciada e digna, conforme determinações constitucionais.

Mas suas expectativas e anseios não foram atendidos. As demarcações de terras, dever do Estado, não se tornaram prioridade e muitos dos procedimentos demarcatórios se encontram paralisados. Poucas foram as terras regularizadas nos dois mandatos do presidente Lula: ele homologou apenas 88 terras, sendo que muitas delas tiveram os procedimentos iniciados em governos anteriores.

A falta de uma atuação mais decisiva por parte do governo Lula no tocante às demarcações é demonstrada nos seguintes dados: das 988 terras, 323 ainda encontram-se sem nenhuma providência; 146 estão em estudo, mas ainda a identificar. Quanto às terras em que os procedimentos de demarcação já tiveram início, a situação atual é a que se segue: 20 estão identificadas; 60 estão declaradas; 35 já foram homologadas e 366 encontram-se registradas e, desse modo, com sua demarcação concluída. Existem ainda 36 áreas que foram reservadas aos povos indígenas.

Os dados evidenciam que os procedimentos de demarcações de terras estão sendo relegados ao esquecimento ou protelados indefinidamente, ao mesmo tempo em que tem se intensificado o processo de criminalização de lideranças indígenas que lutam pela demarcação das terras. Exemplo evidente disso são as perseguições desencadeadas aos líderes do Povo Tupinambá na Bahia.

Para agravar a situação, este governo inaugurou expedientes ilegítimos, tais como a redução de áreas já demarcadas, e a suspensão de portarias que previam a continuidade dos procedimentos demarcatórios. Para exemplificar, podem ser lembradas as suspensões das portarias declaratórias das terras indígenas Guarani Mbyá de Morro Alto, Piraí, Tarumã e Pindoty, nos municípios de São Francisco do Sul e Araquari, em Santa Catarina.

Em síntese, os dados apresentados no quadro abaixo confirmam que no governo Lula a questão indígena recebeu menor atenção do que em todos os governos civis que o antecederam.

PAC “goela abaixo”

Ao fazer esta breve retrospectiva da política indigenista, nos oito anos de governo do presidente Lula, se constatou, de um lado, o interesse em manter o bom discurso, alinhado com os anseios e expectativas dos povos indígenas e de outro, as práticas cotidianas, que diferentemente da retórica de que se garantiriam os seus direitos, se direcionaram para estimular a ambição dos segmentos que historicamente se opõem a eles. Para estes o governo criou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que, na essência, serviu e serve para financiar e apoiar empresas da agroindústria, do agronegócio, os banqueiros, as empreiteiras da construção civil, os conglomerados que investem nas grandes barragens, em mineração, na exploração madeireira e os grandes latifundiários que se dedicam ao monocultivo ou a criação bovina.

Na concepção desenvolvimentista do atual governo, focada apenas em aspectos econômicos, estes segmentos são “produtivos” e viáveis. Os demais – os trabalhadores, os empobrecidos, os povos indígenas, os pequenos produtores – foram rotulados como improdutivos e, desse modo, tratados como sujeitos sem relevância para a economia e para o país. A sensação que se tem é a de que aqueles que governam o Brasil analisam e concebem que os pobres e as “minorias étnicas” devem receber, do poder público, a sua “generosidade” ou “caridade” e não políticas estruturantes. E, além disso, o presidente Lula, seguindo o exemplo dos governos militares, considerou os povos indígenas obstáculos ou entraves ao desenvolvimento e seus direitos constitucionais penduricalhos.

Explode a violência contra os povos indígenas

Nos últimos anos pode-se dizer que foi deflagrada uma intensa perseguição e criminalização de lideranças indígenas que lutam pela terra. Isso ocorreu especialmente na Bahia, Pernambuco, Maranhão, Mato Grosso do Sul. Some-se a isso o alastramento de violências contra comunidades e povos em diferentes regiões brasileiras. Além de terem seus territórios invadidos, de padecerem com a falta de assistência em saúde, estes povos sofreram com o assassinato de 437 pessoas.

A omissão do governo Lula em relação ao intenso processo de violências enfrentadas pelos Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul, e que se pode caracterizar como genocídio, é talvez o elemento mais significativo da falta de interesse pelos povos indígenas. Os abusos contra este povo são denunciados por organizações de defesa dos direitos humanos e indígenas no Brasil e no exterior. Entretanto, mesmo assinando um Termo de Ajustamento de Conduta, no qual a Funai se comprometia em realizar os estudos de identificação e delimitação de áreas de ocupação indígena naquele estado da federação, o órgão indigenista se omitiu. A demarcação das terras poderia ter evitado a morte de centenas de pessoas do povo Guarani Kaiowá. Além disso, uma ação mais eficaz de proteção das comunidades e de punição daqueles que pra ticam as violências poderia ter abrandado, em parte, o sofrimento que lhes é imposto há décadas.

O estado de Mato Grosso do Sul é recordista em violências contra os povos indígenas, e ali as comunidades indígenas são obrigadas a viver em beira de estradas, são expulsas de seus acampamentos e têm seus pertences queimados. Dois professores indígenas foram sequestrados e mortos.

Vale ressaltar que em diferentes estados do Brasil também foram praticados assassinatos de indígenas, e nem todos esses números são divulgados. Os dados registrados são os seguintes:

Orçamento indigenista contingenciado

Os dados da execução do orçamento indigenista, ao longo dos últimos oito anos, também demonstram o descaso com os 241 povos indígenas do país. Mesmo quando há recursos aprovados, estes acabam não sendo executados conforme o previsto. Chegamos ao final de 2010 com apenas 61% do orçamento indigenista liquidado. Programas e ações fundamentais para a sobrevivência física e cultural dos povos indígenas tiveram uma pífia execução de seus recursos. Vejamos:

Estes números indicam que os recursos previstos no Orçamento Geral da União para assistência em saúde, demarcação de terras e recuperação de áreas degradadas não foram aproveitados como deveriam, e tal procedimento é injustificável diante da grave situação vivida pelas comunidades e povos indígenas. Não parece ser, portanto, por falta de recursos que o governo Lula deixou de demarcar terras indígenas e ocupa o pior lugar em termos de desempenho neste quesito, se comparado aos seus antecessores.

Reestruturação x Grandes Empreendimentos

A Funai, durante todo o mandato do governo Lula, manteve-se em estado de letargia e subserviência frente às pressões desencadeadas contra as demarcações de terras. Ao final de 2009, como que num passe de mágica, a equipe do governo decidiu reestruturar o órgão indigenista, através de decreto nº. 7056, expedido no dia 29 de dezembro daquele ano. A referida reestruturação não agradou a muitos dos povos indígenas por apresentar mudanças na estrutura do órgão sem que eles fossem consultados, desrespeitando a Convenção 169 da OIT, ratificada e homologada pelo governo brasileiro. Esse fato gerou um ambiente de extrema desconfiança quanto às reais motivações que levaram o governo a impor as pretendidas mudanças.

É importante ressaltar que o processo de reestruturação da Funai vem se dando num ambiente de intensas disputas territoriais, de forte oposição aos direitos constitucionais dos povos indígenas, e num cenário de disputa dos empreendimentos econômicos vinculados ao PAC, e neste programa pelo menos 450 obras afetam terras indígenas.

Depois de apresentada a proposta de reestruturação do órgão indigenista apenas as coordenações que tratam das questões administrativas, ambientais e aquelas destinadas a estudos sobre os empreendimentos que incidem sobre terras indígenas tiveram planejamentos e ações efetivamente desenvolvidas. Desse modo, pode-se dizer que o órgão indigenista foi colocado, de certa forma, a serviço do PAC, e sua função parece ser, neste caso, a de convencer as comunidades indígenas de que devem dar suas anuências aos projetos a serem executados.

Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI)

No que se refere às demandas para além das questões fundiárias, foram sendo promovidas inúmeras ações nas áreas ambientais, de saúde, de meio ambiente, agricultura, educação. No entanto, muitas delas foram realizadas de maneira pulverizada e desarticulada entre si, sem convergir para a questão central, que é a falta de uma política com efetiva participação indígena.

Na expectativa de solucionar este problema, os povos indígenas apresentaram proposta de criação do Conselho Nacional de Política Indigenista. Ao invés disso, o Governo Federal constituiu a Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), em 2007. Não tendo o status de Conselho, a CNPI não tem poder de deliberação. Os seus membros apresentam as demandas (temas e questões) que afetam os povos indígenas e que devem ser debatidas, estudadas e refletidas para posterior encaminhamento no âmbito do governo e da política indigenista.

Em quase três anos de existência, a CNPI acabou se tornando um ente de articulação de algumas lideranças, mas parece ser desconsiderada no que se refere às ações e políticas a serem implementadas a partir de suas recomendações, já que estas não são assumidas pelo governo. Exemplo disso foi a edição do decreto de reestruturação do órgão indigenista, sem que os integrantes da Comissão tivessem conhecimento de seu conteúdo e muito menos que tenham sido ouvidos a este respeito. Em síntese, as mudanças que deveriam ser antecedidas pelo debate e anuência dos povos indígenas acabaram sendo abruptamente anunciadas desrespeitando, inclusive, os fóruns qualificados para o debate, como é o caso da CNPI.

Só em 2008, após muita pressão dos movimentos indígena e indigenista, o Governo Federal apresentou o Projeto de Lei nº. 3571 que prevê a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista. A sua tramitação segue a passos lentos no Congresso Nacional, pois não lhe foi dada a importância devida.

Também merecem uma avaliação as políticas de saúde e educação. Na assistência à saúde indígena existiram graves e profundas contradições, pois foi transformada em espaço de negociações com partidos políticos, de modo especial com o PMDB. A política esteve estruturada durante mais de uma década no modelo de assistência terceirizada. Os convênios eram estabelecidos entre a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) com ONGs ou prefeituras. Esta relação perdurou até o ano de 2008 quando, por pressão do movimento indígena, em função da intervenção do Ministério Público do Trabalho e de decisão da Justiça, o modelo de assistência (conforme está estabelecido na lei Arouca e pelas deliberações das Conferências de Saúde Indígena) passou a ser tratado no âmbito do Ministério da Saúde. Vale destacar que durante um longo período a Funasa foi alvo de denúncias por malversação de recursos públicos e por corrupção. Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União constataram graves distorções sobre o uso dos bens e recursos e na prestação dos serviços.

Tardiamente e já quase no final de seu governo, o presidente Lula determinou a criação da Secretaria Especial de Atenção a Saúde Indígena. A proposta atende às reivindicações dos povos indígenas, e esta Secretaria será o órgão gestor do Subsistema de Atenção a Saúde Indígena, sob a responsabilidade do Ministério da Saúde. O novo modelo terá como referência os Distritos Sanitários (DSEIs) enquanto unidades gestoras. A Secretaria foi criada formalmente, mas ainda não foi estruturada.

A política de educação escolar indígena tem sido igualmente contraditória. A responsabilidade é do Ministério da Educação (MEC), que repassa os recursos e as atribuições da educação escolar aos Estados que, por sua vez, podem transferi-las aos municípios. Com o objetivo de buscar uma solução para as distorções e contradições existentes na execução da política de educação foram apresentadas propostas dos movimentos de professores indígenas, de entidades de apoio e pesquisadores apontando para uma perspectiva da federalização da política. No entanto, os técnicos do Ministério da Educação optaram por um caminho diferente. Instituíram através do Decreto nº. 6861, de 27 de maio de 2009, os chamados Territórios Etnoeducacionais, antes mesmo da realização de todas as conferências regionais previstas para avaliar e propor alternativas para a educação escolar indígena. Esse processo de reflexão culminou na Conferência Nacional de Educação que, ao invés de discutir as propostas vindas das diferentes regiões, acabou por discutir o fato já consumado do novo modelo. O modelo dos Territórios Etnoeducacionais não foi debatido e sequer é compreendido pela maioria das comunidades e povos indígenas e, porque não dizer, por muitos executores da política que, em geral, são os estados e municípios.

Judicialização dos procedimentos demarcatórios

Nesta avaliação da conjuntura indigenista, não podemos deixar de observar também as crescentes demandas judiciais contra procedimentos de demarcações de terras, em curso ou até em fase de julgamento definitivo. Raras têm sido as decisões que acolhem de maneira favorável os direitos e interesses indígenas. Normalmente as decisões têm um caráter liminar que suspendem os procedimentos demarcatórios até que o mérito seja decidido pelas instâncias superiores, no caso STJ ou STF. Em função destas manobras jurídicas, os processos se arrastam por décadas sem que haja uma solução para o litígio imposto.

Neste sentido, merecem destaque duas ações de grande repercussão e que chegaram ao STF: o caso do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe, do sul da Bahia, ação que tramita há quase 30 anos e que, embora com voto favorável do relator da ação ao povo indígena, ainda não foi julgada; e Raposa Serra do Sol, que teve um desfecho importante, em função de o julgamento ter sido pela manutenção da demarcação em área contínua, mas complexo pelo estabelecimento de condicionantes que afetam todas as demarcações de terras em curso e aquelas que acontecerão no futuro.

Direitos indígenas ameaçados

As opções políticas do governo do presidente Lula o conduziram para a governabilidade a qualquer custo. Para isso, o governo estabeleceu alianças políticas com segmentos retrógrados e possibilitou que certas áreas estratégicas fossem incluídas no rol dos recursos a serem explorados, a exemplo das áreas ambientais, minerais e de energia hidráulica. Além disso, potencializou, seguindo o modelo de governos anteriores, a concentração de renda, de poder e de terras nas mãos de certos privilegiados históricos – os latifundiários, banqueiros, usineiros, empreiteiras, empresários do agronegócio e de energia.

Os povos indígenas, no atual governo, diferentemente de anteriores, se fizeram mais presentes nos espaços públicos, reivindicando e exigindo que as autoridades cumprissem com suas responsabilidades. Nas últimas décadas o movimento indígena, de modo geral, tornou-se protagonista.

No entanto, apesar de uma visibilidade maior e da criação de certos espaços de participação, algumas artimanhas utilizadas por parte daqueles que governam engessaram as ações indígenas em torno de discursos, pedidos de paciência, mais abertura ao diálogo e promessas a serem cumpridas. Com isso, as lutas indígenas que mostraram maior relevância foram aquelas que se organizaram em âmbito local ou regional. As de caráter nacional foram como que dissipadas e muitas delas esvaziadas pela relação que se estabeleceu com setores do governo federal que eram, até muito recentemente, opositores aos governos anteriores e inclusive militantes da causa indígena.

Já os setores anti-indígenas estão cada vez mais articulados. No parlamento brasileiro, diversos projetos de lei tentam impedir que terras indígenas sejam demarcadas. Exemplo disso é a proposta de emenda constitucional que determina que as demarcações de terras sejam autorizadas pelo Congresso Nacional. Sem contar as dezenas de outros Projetos de Lei apresentados por parlamentares para, de algum modo, restringir os direitos indígenas.

Mobilizações à vista

As perspectivas, embora o novo governo esteja em período de montagem, não parecem ser animadoras. Os discursos proferidos pela presidente da República eleita apontam para a continuidade da política desenvolvimentista, toda voltada para os megainvestimentos em obras e na exploração dos recursos naturais. A composição dos ministérios do novo governo evidencia o lado para o qual o pêndulo das ações governamentais penderá. E um dos exemplos foi a recondução de Edson Lobão para o Ministério das Minas e Energia, ministro responsável pela megalomaníaca obra de Belo Monte.

Nos próximos anos haverá certamente muitos embates e debates em torno dos direitos indígenas. Os povos, suas organizações e os aliados da causa terão que se distanciar, num primeiro momento, de certos “vínculos” a pessoas e partidos e buscar construir um cronograma de prioridades para a política indigenista. E também dedicar atenção especial para as centenas de comunidades indígenas espalhadas pelo país que sofrem cotidianamente com a ausência de políticas públicas, apostando fortemente na organização do movimento indígena em âmbito local e regional.

Há grandes desafios a serem enfrentados pelos povos e suas organizações: entre eles, o de apresentar as demandas, mobilizar-se em torno delas para que efetivamente sejam acolhidas e transformadas em políticas públicas, assegurando sua participação em todas as etapas; e o de pressionar o poder público para que as terras sejam efetivamente demarcadas, protegidas, estando a posse e usufruto assegurados aos povos e comunidades.

Sem que isso aconteça, não é possível vislumbrar o efetivo combate às violências, ao descaso, à omissão e à dependência de “políticas” paliativas e compensatórias. Sem isso, na hora de discutir políticas públicas os povos indígenas serão tratados como "entraves" ao propagado "desenvolvimento".

Justiça paraense suspende licenciamento da hidrelétrica Teles Pires

Decisão liminar atende pedido do Ministério Público Federal, que apontou ilegalidades no Estudo de Impactos Ambientais

A Justiça Federal paraense ordenou a suspensão do licenciamento ambiental do aproveitamento hidrelétrico Teles Pires, um dos seis que o governo federal pretende construir no rio de mesmo nome, na divisa do Pará e Mato Grosso. A decisão saiu ontem (14/12) e atende a pedido do Ministério Público Federal.

A ação havia sido iniciada em novembro, antes da Licença Prévia do empreendimento, concedida pelo Ibama na última segunda (13/12). Nela, os procuradores da República Felício Pontes Jr e Claudio Henrique Dias citavam falhas graves nos Estudos de Impacto Ambiental detectadas pelo Tribunal de Contas da União e acusavam o Ibama de tentar “fatiar” o licenciamento das seis usinas previstas para o Teles Pires, em vez de avaliar o impacto global das obras.

“Não há como se permitir que o processo de licenciamento da usina Teles Pires tenha continuidade uma vez constatadas tamanhas falhas. A concessão da licença prévia, não poderia ter sido expedida, haja vista que o EIA/RIMA encontra-se completamente maculado de vícios que precisam ser sanados”, concordou a juíza Hind Ghassan Kayath, da 9a. Vara da Justiça Federal, responsável por questões ambientais.

Pelos planos do governo federal, as hidrelétricas do Teles Pires, um rio federal, teriam licenciamentos compartimentados, um para cada usina. Os procedimentos foram tão rápidos que, em menos de um ano, foram apresentados estudos, feitas audiências e concedidas Licenças Prévias para três usinas, já incluídas no leilão de energia do próximo dia 17/12.

“A urgência inexplicável imposta pelo governo talvez explique porque os mínimos cuidados ambientais não foram tomados e o Ibama ignorou as dez irregularidades dos Estudos Ambientais apontadas pelo Tribunal de Contas da União”, explica o procurador Cláudio Henrique Dias.

Na decisão liminar, a juíza Hind Kayath aponta a pressa e cita uma decisão anterior do Tribunal Regional Federal da 4a Região: “o equacionamento da matriz energética nacional deve ser efetivado livre de açodamentos que comprometam o futuro da sociedade brasileira, sobretudo no tocante à sustentabilidade ambiental”, diz o texto da desembargadora Silvia Maria Gonçalves

“O maior violador das normas ambientais hoje na Amazônia é o próprio Ibama. Acreditamos que o mesmo que aconteceu agora no Teles Pires vai acontecer com os processos de Belo Monte, diante de tantas ilegalidades cometidas pelo governo federal em licenciamentos de hidrelétricas”, resume o procurador Felício Pontes Jr.

O MPF no Pará examina atualmente 14 projetos hidrelétricos do governo federal nas bacias do Tapajós-Teles Pires, Xingu e Araguaia-Tocantins, todas com ilegalidades já detectadas nos procedimentos de licenciamento ambiental.

O processo sobre a usina Teles Pires pode ser consultado no site www.jfpa.jus.br, pelo número 33146-55.2010.4.01.3900.

Procuradoria da República no Pará

Assessoria de Comunicação

Mais informações à imprensa: Helena Palmquist

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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Licença prévia da usina Teles Pires é mais uma agressão aos povos amazônicos

Essa tal energia “limpa, barata e sustentável” tem sido a cruz que os povos amazônicos estão carregando como um “pagador de promessas”. O governo promete e o povo paga!


Telma Monteiro

A Licença Prévia da UHE Teles Pires foi concedida ontem (13) pelo IBAMA. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), MauricioTolmasquim, havia “previsto” a sua emissão e divulgou a notícia no twitter. Quando questionei publicamente a certeza com que Tolmasquim antecipava esse ato administrativo do IBAMA, um representante de um site de notícias de energia sugeriu que há uma “interação entre MME e MMA nessa área”.

Pois bem, interação entre o Ministério de Minas e Energia (MME), Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA) não falta, quando o tema é emissão de licença ambiental ilegal para grandes projetos hidrelétricos na Amazônia. Foi assim com as usinas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, com Belo Monte no rio Xingu. Então o modus operandicontinua o mesmo e ainda é reforçado pelo nosso judiciário que nunca vê erro algum nos processos de licenciamentos patrolados pelo governo federal.


E dá para antecipar que vai piorar, porque vem aí o grande chefe Edison Lobão, gestado pelo clã Sarney, e bem alimentado pela ex-ministra de Minas e Energia e agora presidente eleita Dilma Rousseff. Outro dia em alguma matéria estava escrito que Dilma era uma especialista em energia e como tal reconduz ao MME um autoritário que sabidamente não entende absolutamente daquilo que vai tratar sua pasta. Que ofensa para os especialistas em energia!

Grandes complexos hidrelétricos foram inventados no governo Lula e tudo indica que outros estão sendo arranjados para programar o que se chama de crescimento ou desenvolvimento, utilizando energia que não é limpa, nem barata e nem sustentável. Essa tal energia “limpa, barata e sustentável” tem sido a cruz que os povos amazônicos estão carregando como um “pagador de promessas”. O governo promete e o povo paga!


A usina Teles Pires faz parte de um conjunto de cinco aproveitamentos no rio Teles Pires e é a maior em capacidade instalada, aliás outro conto do vigário. Capacidade instalada de uma usina hidrelétrica é aquele número que o governo usa para fazer de conta, mas que na verdade o que a usina vai mesmo produzir não chega, às vezes, a um terço do anunciado. Nesse caso, de Teles Pires, o anúncio é de 1.820 MW de capacidade instalada, mas só iria mesmo produzir mesmo 900 MW. Em Belo Monte é ainda pior, pois de 11.000 MW anunciados de capacidade instalada não chegaria a 1.100 MW, segundo os verdadeiros especialistas, aqueles que não pertencem à mesma escola de Dilma Rousseff e de Edison Lobão.


Além das 63 condicionantes e recomendações feitas pela equipe técnica do Ibama, no parecer que subsidiou a Licença Prévia do Teles Pires, o presidente da Funai, Marcio Meira, assinou um ofício em que “não vê óbices para a emissão da Licença Prévia”. Acrescentou, então, mais 14 condicionantes. Dá para imaginar como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da UHE Teles Pires está mesmo furado como uma peneira! Precisa de todas essas emendas na forma de condicionantes para poder tapar todos os buracos.


Entre as condicionantes que a FUNAI listou estão algumas que chamam a atenção: apresentar programas de monitoramento dos impactos na pesca que afetarão os povos indígenas; analisar a qualidade da água rio abaixo da UHE Teles Pires para identificar os impactos nos ecossistemas; fazer a classificação dos rios nas terras indígenas e indicar os fatores que podem afetá-los; fazer estudos sobre os indígenas isolados na região da UHE Teles Pires. Com esses exemplos dá para se ter uma idéia das deficiências dos estudos analisados pelo Ibama.


A LP foi concedida no escuro, sem conhecimento e sem o diagnóstico dos principais impactos que vão afetar os povos indígenas e os ecossistemas da região e o EIA é tão ruim que, além das lacunas explícitas nas condicionantes tanto do IBAMA como da Funai, o próprio Tribunal de Contas de União já havia detectado as irregularidades. Até medidas necessárias para ampliação da vida útil da UHE Teles Pires, sob risco associado à manutenção das turbinas, está entre as condicionantes do parecer técnico.


Será mesmo que a equipe técnica do IBAMA é tão pressionada politicamente a ponto de inserir condicionantes para não escrever com todas as letras que o empreendimento não tem viabilidade ambiental? O parecer técnico tem frases do tipo "condicionantes deverão ser cumpridas pelo empreendedor para assegurar, na opinião desta equipe, a viabilidade ambiental do empreendimento" e constata que “algumas questões presentes no estudo de impacto ambiental da UHE Teles Pires deverão ser objetos de ajustes”.

Todas as 63 condicionantes/recomendações que estão no parecer técnico que subsidiou a LP da UHE Teles Pires apontam para um EIA/RIMA que não cumpriu seu papel de diagnosticar impactos sociais e ambientais. Imagine-se a qualidade dos estudos apresentados. Reproduzo aqui alguns trechos do acórdão do TCU sobre a UHE Teles Pires:

(...) Nesse sentido, o EIA do AHE Teles Pires não apresentou a análise dos impactos das alternativas do projeto;

59. O RIMA não apresenta informações sobre os objetivos e as justificativas do empreendimento de forma clara. Não há uma seção no relatório tratando especificamente destes aspectos, apenas menções sobre a importância da obra nas considerações finais do documento. Tampouco há a discussão da relação e da compatibilidade do AHE com as políticas setoriais, planos e programas governamentais;

65. O relatório não atende esse aspecto, pois apenas enfatiza a importância estratégica do AHE Teles Pires para o alcance das necessidades de desenvolvimento socioeconômico do país. Não são apresentadas informações que permitam comparar diferentes possibilidades e alternativas, de modo a facilitar a formação de juízo de valor sobre a conveniência ou não de instalação do empreendimento.

66. O RIMA deve ser apresentado de forma objetiva e adequada a sua compreensão. As informações devem ser traduzidas em linguagem acessível, ilustradas por mapas, cartas, quadros, gráficos e demais técnicas de comunicação visual, de modo que se possa entender as vantagens e as desvantagens do projeto, bem como todas as consequências ambientais de sua implementação (parágrafo único).

67. Considera-se que o relatório não atendeu esse aspecto. A linguagem empregada frequentemente utiliza termos técnicos, de difícil entendimento pelo público leigo. Há longos trechos apenas com texto, sem o recurso de gráficos ou quadros sintéticos que ajudem a explicar e contextualizar os dados apresentados. Não foram apresentadas informações suficientes para permitir a compreensão dos impactos do empreendimento comparativamente com possíveis alternativas.


Telma Monteiro

Coordenadora Energia

Kanindé - Associação de Defesa Etnoambiental

http://telmadmonteiro.blogspot.com/

https://twitter.com/TelmaMonteiro

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Dom Erwin Kräutler recebe hoje prêmio Right Livelihood Award 2010

Premiação é reconhecimento por seu trabalho de luta e dedicação junto aos povos indígenas e à Amazônia brasileira

Dom Erwin Kräutler, bispo da Prelazia do Xingu, em Altamira (PA) e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) recebe hoje, 6 de dezembro, o prêmio Right Livelihood Award 2010. A premiação reconhece o longo e dedicado trabalho do bispo junto os povos indígenas e à Amazônia brasileira. A cerimônia de premiação começa às 18 horas, horário local suíço, no Parlamento Sueco.

Juntamente com dom Erwin, recebem o prêmio Nnimmo Bassey, diretor executivo da entidade Environmental Rights Action (Nigéria) e presidente da ONG Friends of the Earth Internacional, Narendra Bahadur, diretor executivo da Sappros, e Dr. Marton Ruchama, fundador e presidente da organização Physicians for Human Rights-Israel.

O evento de premiação será transmitido, em tempo real, na web e pode ser acessado pelo site www.rightlivelihood.org.

Os premiados deste ano participaram de coletiva de imprensa onde falaram da premiação. Confira abaixo:

Dom Erwin Kräutler

“Eu aceito o Right Livelihood Award, em nome de quem luta comigo hoje - em nome dos povos indígenas, a Amazônia e os direitos humanos. Aceito-o também em nome das dezenas de pessoas que deram suas vidas, cujo sangue foi derramado e que foram brutalmente assassinadas porque se opunham à destruição sistematizada da Amazônia.

Sinto-me honrado com o prêmio em um momento, quando a nossa luta em prol dos povos indígenas está tomando novas dimensões e maior importância em face dos projetos de desenvolvimento que ameaçam a Amazônia”.

Nnimmo Bassey

“Com cerca de 60% das reservas mundiais de petróleo bruto já esgotados, é impressionante ver os políticos acreditando que podem continuar correndo para a eternidade com menos de metade de um tanque. Enquanto o mundo busca energia barata, alguém tem que pagar por isso. No que diz respeito ao setor dos combustíveis fósseis, quem está pagando o preço para que outros desfrutem são as comunidades em cujo território seja encontrado petróleo, os ambientes degradados e, claro, a atmosfera global.

Para inverter esta tendência destrutiva e profundamente injusta, na semana passada, juntamente com laureado do Right Livelihood Award Vandana Shiva e outros, abri um processo histórico no Tribunal Constitucional do Equador contra a British Petroleum por seus crimes contra a natureza. É tempo para os povos ao redor do mundo juntarem as mãos e enfrentar firmemente os interesses corporativos aniquiladores para defender o nosso planeta e construir um futuro saudável”

Narendra Bahadur, Diretor Executivo de SAPPROS

“O Nepal tem o nível mais alto de pobreza no Sul da Ásia: dois terços da nossa população é pobre, o que contribui para a persistência de conflito. No entanto, a experiência do Nepal tem mostrado que podemos fazer da pobreza, parte do passado se nós confiarmos na habilidade dos pobres.

Para ajudar os pobres a vencer a pobreza, é preciso adotar um modelo holístico de mobilização social, que inclui tecnologia, desenvolvimento institucional, infra-estrutura, acesso ao mercado e, sobretudo, a capacitação para gerir recursos locais. Os pobres devem se tornar sujeitos do desenvolvimento ao invés de objetos!

Os pobres não são o problema, mas parte da solução. Assim, nós precisamos confiar neles”.

Dr. Marton Ruchama, Fundador e Presidente de Physicians for Human Rights-Israel

“A principal preocupação do Physicians for Human Rights-Israel é lutar contra injustiças que resultam da conduta humana, ao invés de doenças causadas por micróbios. Como uma organização de direitos humanos, somos, por definição, política, e nos colocamos contra e denunciamos violações dos direitos humanos perpetradas pelo regime. Como se pode curar as feridas de uma vítima de tortura, sem apontar para o sistema de tortura? Como se pode tratar a praga da diarréia - quer nos territórios ocupados da Faixa de Gaza ou em aldeias beduínas não reconhecidas - sem tratar a sua causa: a política do governo que nega às pessoas acesso a água adequada?

Nós, de PHR-Israel enxergamos este prêmio como um prêmio para os profissionais de saúde israelenses e palestinos que foram capazes de manter o respeito mútuo e a cooperação no meio da dor, do derramamento de sangue, do medo e do ódio”.

Premiação

Fundado em 1980, os Prêmios do Right Livelihood Award são apresentados para a 31ª vez este ano. O valor total do prêmio é de 200.000 euros, partilhado por todos os quatro premiados. Este ano, houve 120 propostas de 51 países, dos quais 69 candidatos de países "em desenvolvimento". Há, agora, 141 premiados de 59 países.



The Right Livelihood Awards será apresentado às 18 horas horário local), no Parlamento Sueco. Os discursos de aceitação do prêmio estarão disponíveis no site www.rightlivelihood.org/press_room.html.

Video – (com qualidade para emissão, de uso livre) em apoio a este comunicado de imprensa está disponível em http://download.rightlivelihood.org/files/
(oferecendo vídeos sobre Erwin Kräutler, Physicians for Human Rights-Israel, e SAPPROS)

Por favor note que nós vamos disponibilizar fotos e vídeo da cerimônia no nosso servidor FTP, o mais rapidamente possível, por isso, verifique nosso site nas horas seguintes à cerimônia.

Contato:



Right Livelihood Award Foundation

PO Box 15072

104 65 Stockholm , Sweden / Suécia

Telefone: +46-8-702 03 40 begin_of_the_skype_highlighting +46-8-702 03 40 end_of_the_skype_highlighting

Fax: +46-8-702 03 38

E-mail: press@rightlivelihood.org, info@rightlivelihood.org

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Belo Monte está violando direitos fundamentais dos povos indígenas, denunciam as lideranças indígenas do Xingu, Raoni Metuktire, Megaron Txukarramãe,

Belém, 03 de dezembro de 2010

Reunidos no III Encontro Latinoamericano de Ciências Sociais e Barragens que se iniciou no dia 30 de novembro de 2010 em Belém, as lideranças indígenas Kaiapó Raoni Metuktire e Megaron Txukarramãe, e as lideranças Arara, Josinei Arara e Juruna, Ozimar Juruna denunciam o atropelo com que o governo brasileiro vem tentando implementar as barragens de Belo Monte no rio Xingu e as continuas violações de seus direitos fundamentais ao longo desse processo.

Para Megaron, o interesse do governo é só ganhar dinheiro, não interessa se os povos indígenas vão sofrer, se vão ser prejudicados. Só querem ganhar dinheiro, muito dinheiro. O Lula e a Dilma não ouvem a gente – só ouvem quem dá muito dinheiro para eles. A pior marca do Lula para os indígenas vai ser Belo Monte. Ele denuncia a cooptação de lideranças indígenas pelo próprio governo, que tem colocado parente contra parente. “A Eletronorte está oferecendo gasolina e cesta básica para alguns indígenas, sem falar sobre os impactos de Belo Monte. Tem muitos interesses lutando para diminuir nossas terras, mas nosso povo está crescendo... que rios vamos ter para pescar? O Xingu é nosso rio, nosso mercado, nossa feira. Vivemos de caça, pesca, roça familiar.... Desde sempre somos contra, vamos ser contra até o fim. Podem trazer caminhão de dinheiro, mas vamos dizer não a Belo Monte.”

Raoni Metuktire, principal liderança kaiapó que nos anos 1980 liderou uma grande articulação indígena contra a construção do complexo hidrelétrico Kararaô no rio Xingu culminando com o abandono do projeto na época pelo governo, vem mais uma vez à público reafirmar sua posição contrária a construção de Belo Monte e denunciar a falta de consulta dos povos indígenas em todo o processo. “O governo brasileiro devia consultar nós povos indígenas e respeitar nossos direitos, primeiros habitantes deste lugar. Se querem fazer, tem que perguntar primeiro, fazer consulta primeiro. Mas não, vem fazendo coisas para prejudicar nós indígenas, querem fazer de qualquer jeito. Deveríamos viver em paz – vocês respeitam nós indígenas, e nós respeitando vocês. Não quero briga, só quero que vivemos em paz. Não tem caminhão de dinheiro que me faça ser a favor de Belo Monte e reafirmo que não quero a construção de Belo Monte. Não quero mais ouvir de Belo Monte. Vamos deixar o rio do jeito que está.”

As violações de direitos humanos dos povos indígenas e comunidades afetadas pelo projeto de barragens de Belo Monte foram objeto de diversas análises e apresentações realizadas durante o evento, por cientistas sociais e advogados e defensores de direitos humanos que vem acompanhando o caso. Uma das principais denúncias ao governo brasileiro é a não-realização das oitivas indígenas pelo Congresso Nacional, previstas na Constituição Federal e na Convenção OIT 169 da qual o país é signatário. Em outubro desse ano, o país recebeu uma recomendação por parte do Relator Especial da ONU sobre direitos humanos e liberdades fundamentais indígenas, James Anaya, no sentido de realizar as oitivas indígenas e considerar o resultado dessas consultas na decisão de se construir ou não as barragens de Belo Monte.

O III Encontro Latinoamericano de Ciências Sociais e Barragens reuniu cerca de 300 pesquisadores, representantes de movimentos sociais e de comunidades indígenas, advogados e defensores de direitos humanos e organizações não-governamentais.

Para mais informações:
Renata Soares Pinheiro
Movimento Xingu Vivo para Sempre
http://www.xinguvivo.org.br/
(93) 9172-9776

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Povos indígenas na Amazônia estão ameaçados: representação ao MPF do Pará pede para suspender o processo de licenciamento de Belo Monte

A Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e a Associação para Povos Ameaçados (STP) - Brasil denunciaram que a mega-barragem de Belo Monte, planejada para ser construída no rio Xingu, no coração da Amazônia, ameaçaria a sobrevivência de povos indígenas em isolamento voluntário.

A representação que recebeu o apoio de organizações não-governamentais do Brasil, da Europa e dos EUA, foi entregue oficialmente ao Ministério Público Federal do Pará, no dia 25 de novembro, durante o V Fórum Social Pan-Amazônico 2010.

A representante da STP, Rebecca Sommer, colheu dezenas de depoimentos de lideranças dos povos indígenas da região do Xingu que manifestaram repetidamente suas preocupações e incertezas com o projeto. Depois de receberem declarações contraditórias das autoridades e empresas sobre as conseqüências diretas e indiretas da mega-barragem de Belo Monte e de nunca ter sido solicitada sua aprovação, os indígenas estão diante de uma realidade ainda mais assustadora.

Nas terras indígenas da região planejada para a construção da barragem, geólogos já comprovaram a existência de vastos depósitos de recursos minerais. Segundo os estudos ambientais do projeto de Belo Monte, elaborado pela estatal Eletrobrás, várias empresas já solicitaram ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) autorização de pesquisa de lavra mineral. Na reserva Apyterewa, por exemplo, há pedidos de várias empresas, entre elas a Vale. As autorizações de pesquisa minerária foram solicitadas para 63% da área das reservas na região Xingu. Os próprios povos indígenas nunca foram informados nem deram seu consentimento para qualquer futura de mineração em seus territórios.

Desde a Constituição brasileira de 1988 que reconheceu os direitos de proteção aos povos indígenas, foram demarcadas mais de 20% de Terras Indígenas na Amazônia. Essa proteção, no entanto, poderá ser sacrificada em decorrência da exploração dos recursos naturais. Isso contraria o tratamento que o Brasil vinha dando aos povos indígenas, elogiado até agora, mas que já está sendo questionado.

Para os indígenas em isolamento voluntário avistados a apenas 70 km do local onde está prevista a barragem principal de Belo Monte, este projeto é particularmente devastador já que essa região de perambulação dos isolados ainda não está sob proteção oficial. É nessa área que o governo do estado do Pará pretende lançar um programa de manejo de mandeira.

À luz desta situação alarmante a Kanindé e a STP, com o apoio das demais organizações e movimentos, protocolaram no MPF do Pará a representação que denuncia as ameaças à sobrevivência dos indígenas em isolamento voluntário. A representação pede que seja suspensa a construção da hidrelétrica Belo Monte se forem comprovadas as irregularidades.

Para mais informações:

Telma Monteiro

Fone 55 11 4683 2157
telmadm@uol.com.br

Vídeos dos depoimentos:

http://www.youtube.com/watch?v=DOGMpcUXSEI

http://www.youtube.com/watch?v=iEq70whdLPQ

http://www.youtube.com/view_play_list?p=169E4C6A62CF95F6