Publicado em 05 de dezembro de 2011
Por Xingu Vivo
A reunião entre governo, consórcio Norte Energia (NESA) e lideranças indígenas das aldeias do Médio Xingu, ocorrida na última quinta, 1, terminou com poucas respostas concretas e diversos encaminhamentos genéricos. O encontro foi convocada pelas etnias Xipaya, Xicrin, Kuruaya, Arara, Juruna, Assurini, Araweté, Parakanã e Kayapó para discutir problemas, denúncias e pendências relativas ao projeto de Belo Monte.Por Xingu Vivo
Apesar da exigência dos índios, encaminhada no dia 25 de novembro, da presença da presidência da Funai e de diretores do Ibama e do Incra com poder de decisão, participaram da reunião apenas representantes da Secretaria Geral da Presidência e do departamento de licenciamento ambiental do Ibama, além do Ministério Público Federal em Altamira e do diretor de assuntos socioambientais da NESA.
Uma das primeiras demandas apresentadas pelos indígenas foi o cumprimento das condicionantes, em especial a solução da situação conflituosa da Terra Indígena (TI) Apiterewa, ocupada em grande parte por fazendeiros e pequenos agricultores, e sem previsão de retirada dos invasores. De acordo com os indígenas, os postos de vigilância na TI têm graves problemas e várias lideranças têm sido vítimas de ameaças de morte, mas até o momento não havia, por parte do Incra, nenhuma informação sobre a retirada e realocação dos invasores.
Representantes da aldeia juruna mais próxima às obras, por outro lado, reiteraram a posição contrária à usina e voltaram a exigir do governo que paralisasse Belo Monte. Segundo os juruna, obrigações com agricultores e indígenas não estão sendo cumpridas pela NESA, e a FUNAI em Altamira tem se aliado à empresa. Também denunciaram que não têm informações sobre o projeto de ampliação de sua aldeia; que o tratamento de saúde é precário; que não há poço em sua aldeia, sendo que bebem a água do rio Xingu; que não recebem educação de qualidade; que a “zoada” das máquinas espanta a caça; e que os indígenas estão sendo prejudicados “enquanto a empresa só aumenta seu desenvolvimento”.
Ainda de acordo com os juruna, já estão ocorrendo roubos na comunidade e as obras de asfaltamento da PA 415 tem causado impactos e problemas, como a escavação de um igarapé e enchentes nos períodos de chuva.
De acordo com o relatório da reunião, foi denunciado também que: “na época de seca, demora-se um dia pra chegar às aldeias; que o rio irá secar; que [a NESA e o governo] querem que os índios vivam de agricultura, mas a tradição deles é a pesca; e que foi prometido pela Norte Energia empregos para os indígenas, o que ainda não aconteceu”, entre outros.
Sobre as oitivas, contrariando o governo e a Funai, os indígenas continuam negando que estas tenham ocorrido. De acordo com os índios, “o pessoal de Belo Monte apenas foi às aldeias falar sobre o processo de instalação da empresa, e o IBAMA também não realizou oitivas”. Diante disso, exigem a realização e a paralisação das obras até que sejam feitas. “Também foi dito às aldeias [pelo consórcio Belo Monte] que as condicionantes seriam cumpridas, para posteriormente iniciarem as instalações da obra, o que não ocorreu, denunciaram..
Por fim, os índios também criticaram duramente os trâmites do Plano Básico Ambiental (PBA, conjunto de medidas para minimizar ou solucionar problemas causados pela usina), uma vez que foi acordado que os estudos de impacto seriam apresentados aos indígenas antes de sua finalização e aprovação, o que não ocorreu. De acordo com o representante da NESA, o PBA já está pronto, mas, se for necessário, a empresa voltará às aldeias para “conversar”.
Reconhecimento de impactos com respostas vagas
De acordo com o Diretor Socioambiental da Norte Energia, Antonio Coimbra, a empresa
reconhece que os maiores impactos de Belo Monte atingirão as aldeias Juruna do km 17, Paquiçamba e Arara, mas que os Xicrin da TI Trincheira Bacajá também enfrentarão problemas; principalmente para atravessar a barragem da usina, que fechará seu acesso por rio à Volta Grande do Xingu e à Altamira. Por outro lado, Coimbra também reconheceu impactos sobre o próprio rio Bacajá.
Quanto aos encaminhamentos – foram apresentados 18 demandas –, boa parte ficou sem resposta concreta. Já na primeira questão – descumprimento das oitivas indígenas -, o governo foi inflexível e exigiu sua retirada da pauta afirmando que se trata de ponto inegociável. Sobre as denúncias de não cumprimento das condicionantes indígenas, o MPF ficou de requisitar à NESA um relatório para verificar o seu andamento. Já o governo informou que, no caso da retirada dos invasores da TI Apiterewa, a previsão é que os ocupantes de boa-fé serão retirados até fevereiro de 2012 e realocados em uma fazenda já disponibilizada para este fim. Posteriormente, serão retirados os invasores de má-fé. Por fim, como durante toda a reunião foram feitas duras críticas à Funai e às práticas do órgão na região, o governo afirmou que encaminhará a questão à Brasília.
Uma série de outras demandas focou na questão de repasse de recursos. Segundo os indígenas, uma verba de R$ 30 mil/mês, prevista no plano emergencial ambiental (mitigação de impactos) e que deveria ser repassada pela NESA às aldeias, tem sofrido desvios, malversação e são aplicadas apenas na compra de produtos que tem de ser solicitados pelas aldeias através de listas de compras. De acordo com os indígenas, os produtos são superfaturados, não chegam às aldeias como solicitados, e quando chegam, são de péssima qualidade.
Além de reparação nesses procedimentos, diante do surgimento de novas aldeias no último período – nove, no total -, os indígenas exigiram que os benefícios sejam estendidos a estas também, argumentando que o dinheiro não deve ser definido pelo critério “per cápita”, mas pelo número de aldeias. Também exigiram um aumento do valor, considerado insuficiente, e pagamentos enquanto a usina Belo Monte existir.
Diante das denúncias de malversação das verbas, a NESA se comprometeu a “verificar as discrepâncias e depois justificá-las melhor”. Por outro lado, exigiu que os indígenas justifiquem o pedido de aumento do valor, para que o consórcio possa discutir a questão com a Funai. De qualquer forma, os recursos só serão pagos até dezembro de 2012 e não pelo período de existência da usina, avisou a empresa. Já para outro plano de repasses – destinado a projetos de fortalecimento cultural -, que atualmente prevê R$ 50 mil às aldeias, a empresa concordou em aumentar o valor para R$ 80 mil, apesar da demanda ter sido R$ 150 mil.
Expulsão de observadores
A reunião entre índios e governo foi precedida de uma grande confusão quando o governo resolver exigir a retirada de todos os observadores da Casa do Índio, local do encontro. Na semana anterior, várias lideranças indígenas haviam gravado um vídeo convocando observadores e imprensa para a reunião, como forma de “proteção contra as mentiras da NESA e do governo”.
Argumentando medo de alguma ação radical por parte dos índios, como seqüestros ou protestos, porém, o governo, escoltado por um forte aparato policial, exigiu a retirada de todos os não-índios – representantes dos movimentos sociais, antropólogos da Funai, acadêmicos, pesquisadores e jornalistas –, o que desagradou a muitas lideranças indígenas presentes no encontro.
“Mais uma vez o governo Federal consegue deslegitimar a voz das populações indígenas, modificando parte da programação feita por nós, fechando o diálogo que deveria ser público, colocando os indígenas em uma situação de extremo desconforto com as organizações que convidamos, estiveram presentes e foram praticamente expulsas. Muitas lideranças ficaram indignadas com o resultado de tudo, de como as coisas foram conduzidas”, afirmou Sheyla Yakarepi Juruna, liderança juruna e membro do Movimento Xingu Vivo para Sempre.
para governo, índio bom, é índio morto
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