terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Nota sobre medidas de proteção aos direitos das populações Xicrin da TI Trincheira Bacajá

Publicado em 05 de dezembro de 2011

Por Xingu Vivo
Em meados de setembro, representantes das aldeias Xicrin da Terra Indígena (TI) Trincheira Bacajá, localizada às margens do rio Bacajá – um dos principais afluentes do Xingu na Volta Grande do rio -, procuraram o Movimento Xingu Vivo para Sempre (MXVPS) para solicitar uma reunião urgente com o movimento e o Ministério Público Federal.
O pedido de audiência foi feito em nome das lideranças mais velhas da TI diante da situação insustentável das aldeias no tocante à segurança alimentar, educação e saúde, o temor e as incertezas sobre os impactos de Belo Monte, e principalmente a sucessiva série de descumprimentos de acordos assumidos pela Norte Energia (NESA).
Atendendo ao convite da ABEX – Associação Beby Xikrin, em meados de outubro o MPF foi às aldeias Mrotidjam e Bakajá, acompanhado de representantes do MXVPS e de uma antropóloga, para responder a questionamentos relativos a impactos da UHE Belo Monte, saúde, educação e de um projeto de mineração da Vale na terra indígena (para ler nota do MPF sobre a reunião, clique em http://tinyurl.com/6r99ohk).
Os mais velhos das várias aldeias da TI, representando seus povos, destacaram nessas reuniões as seguintes questões:
- Os indígenas nunca tiveram real conhecimento do que será a barragem de Belo Monte
- Nas inúmeras reuniões com representantes da Nesa, do Ibama e da Funai, quando perguntavam sobre as conseqüências da barragem na Volta Grande do Xingu e no rio Bacajá, foram informados de que uma outra equipe viria para responder os questionamentos, o que nunca aconteceu.
- Os peixes, que compõe a base de sua dieta, sobem o rio Bacajá até a cabeceira para
desova. Eles são provenientes da Volta Grande do Xingu. Com a diminuição de 80%
a 90% no volume de água da Volta Grande do Xingu, eles desaparecerão.
- Acordos da Nesa que prometeram melhoria nas moradias e veículos para a fiscalização da área nunca foram cumpridos.
Acerca dos problemas relativos à utilização das verbas emergenciais de R$ 30 mil/mês por aldeia, pagos pela Norte Energia como compensação ambiental, afirmaram que:
- O dinheiro é aplicado através de listas de mercadorias e bens, que são comprados em quantidade e qualidade inferiores e preço acima do mercado.
- Jamais tiveram acesso às notas fiscais desses produtos.
- Os produtos comprados pela Nesa são de péssima qualidade.
- Os motores das voadeiras não funcionam.
- Foi denunciado tratamento desrespeitoso por empregados da Norte Energia.
- Denunciaram que um representante da Norte Energia exigiu a assinatura de nota de 300 quentinhas referentes à alimentação de indígenas em atividade em Altamira, quando só havia uma família Xikrin na cidade.
- A Nesa prometeu ferramentas agrícolas, como facão, machado e outros, e não entregou. Nem mesmo as mudas de cacau que seriam enviadas às aldeias chegaram.
Sobre os demais pontos da pauta, foram apresentadas uma série de denúncias quanto à falência dos atendimentos de saúde (maus tratos a indígenas enfermos, meses de espera para atendimento, falta de limpeza dos espaços de saúde, quartos imundos, etc), da educação (os professores estão passando, no máximo, quatro meses nas aldeias, o ensino só atende crianças até a quarta série primária, jovens não conseguem se acostumar com a vida em Altamira quando são forçados a completar os estudos na cidade, etc), e ainda sobre o projeto de mineração Salobo da Vale (maior jazida de cobre já descoberta no Brasil, cujas atividades começariam no segundo semestre de 201), que, de acordo com os indígenas, vai atingir a parte sul da TI Trincheira Bacajá.
Por fim, os Xicrin exigiram que o MPF fiscalize a aplicação dos recursos destinados às aldeias através do plano emergencial ambiental, bem como acione a Justiça, em seu nome, no sentido de paralisar a construção de Belo Monte.
Em cumprimento de sua função, em atendimento às demandas das lideranças Xicrin e adotando linguagem que buscou facilitar o entendimento dos representantes das aldeias ali presentes (entre os quais muitos não falam ou entendem português), o MPF explicou as bases legais das condicionantes indígenas – de cumprimento obrigatório da Norte Energia -, e os trâmites dos repasses de recursos, à luz dos direitos das populações da TI.
Sobre a TI Trincheira Bacajá
A Terra Indígena Trincheira Bacajá (TITB), composta originalmente pelas aldeias Mrotidjam, Bacajá, Pàt-Krô e Pykayakà, foi homologada em outubro de 1996 através de Decreto Federal. Localizada nos municípios de Pacajá, São Félix do Xingu, Senador José Porfírio, Anapu e Altamira, possui uma área de aproximadamente 1.650,939 ha, destinada à posse do grupo indígena Xikrin.
De acordo com o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de Belo Monte, a TITB estaria na Área de Influência Indireta da usina, apesar do fato de que a usina levará à “uma evidente ruptura do nível de base do rio Bacajá”. Em suas considerações finais, no entanto, afirma que, “considerando a vulnerabilidade da Terra Indígena Trincheira Bacajá em relação ao empreendimento, é importante destacar a necessidade de se estender os estudos dos meios físico e biótico para o curso do rio Bacajá, de forma a complementar os estudos realizados no âmbito do EIA-RIMA ao longo do rio Xingu, e de modo a favorecer uma análise integrada. É importante que se defina qual será a interferência do hidrograma ecológico, proposto para o Trecho da Vazão Reduzida do rio Xingu, na dinâmica do rio Bacajá, e consequentemente no meio biótico, no modo de vida e na reprodução física e cultural da população indígena da TITB”.
Ainda nas considerações finais, o EIA afirma que “os índios constituem uma sociedade cuja economia tem alto grau de subsistência, ficando evidente que é enorme a dependência econômica em relação ao seu território e aos recursos naturais nele presentes. (…) Ficou claro que esta sociedade tem, como vetor principal para o desenvolvimento de suas atividades de subsistência e das relações sociais entre as aldeias, o rio Bacajá. Conforme indicado neste estudo, algumas premissas devem guiar a elaboração de um Plano de Gestão da Terra Indígena Trincheira Bacajá, sendo elas: ampla e permanente participação indígena, transparência de informações, contato direto com a comunidade, compromissos sustentáveis, considerações das especificidades socioculturais indígenas e considerações das perspectivas dos índios”.
Diante do inequívoco reconhecimento oficial de que o rio Bacajá e a TI Trincheira Bacajá sofrerão impactos da usina de Belo Monte; diante do fato de os estudos adicionais estarem sendo realizados posteriormente à emissão da Licença de Instalação – que, legalmente, teria de ser concedida apenas após a avaliação completa dos prejuízos causados pelo empreendimento; diante do fato de que os Planos Básicos Ambientais (PBAs) para a TITB não consideram tais impactos, por serem desconhecidos; e diante das inúmeras denúncias de abusos, desvios de verbas e descumprimentos de acordo por parte da NESA, o Movimento Xingu Vivo para Sempre solicita ao Ministério Público Federal que, além de cumprir sua função no esclarecimento de fatos e dos direitos das populações indígenas, tome as medidas legais cabíveis para extinguir todo e qualquer abuso e ilegalidade cometidos pelo consórcio Norte Energia, pelo Ibama, pela Funai e por demais órgãos envol vidos na construção de Belo Monte.
Altamira, 3 de dezembro de 2011
Movimento Xingu Vivo para Sempre
 

Um comentário:

  1. felipe dos santos gatinho rocha ou puxirum6 de dezembro de 2011 às 13:07

    cadê um modo de viver sério, contra o estado?
    estou, a algum tempo, disposto a lutar para destruí-lo, no que ele é de mais asqueroso: existe para defender o dinheiro, o acúmulo, a propriedade privada, a autoridade, o monopólio, o governo, e a tirania que esmaga os oprimidos e empobrecidos

    um exemplo são as filas nas portas de hospitais, desde a madrugada, de gente que é tratada deleteriamente, à manuntenção de currais eleitorais com bolsas de esmolas para fazer o mercado funcionar, e botar sorrisos na boca dos inimigos de classe que curtem com nossas misérias, nossos medos, nossas ignorâncias

    o estado são as pessoas que o encarnam e o reproduzem, e tira milhão de quem não tem tostão


    recomendo a leitura da obra de pirre clastres a sociedade contra o estado, um texto honestamente libertário

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