sexta-feira, 24 de junho de 2011
Sem-teto ocupam terreno da Eletronorte e sofrem dois despejos em uma semana
Publicado em 23 de junho de 2011
Por Xingu Vivo
Nestas terça (21) e quarta (22), a polícia agiu com violência na retirada de famílias sem-teto que ocuparam, no inicio da semana, uma área que, de acordo com a Policia Civil de Altamira, pertence à Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A (Eletronorte).
Esta é a segunda ocupação urbana na última quinzena, totalizando cerca de 400 famílias em processo de êxodo residencial. Ao todo, mais de 6 mil famílias serão atingidas diretamente por alagamento na cidade de Altamira, principal centro urbano atingido pela barragem.
No terreno da Eletronorte, a primeira ação policial ocorreu na terça, quando cerca de 120 famílias oriundas de bairros que serão alagados pela construção da Usina de Belo Monte foram retiradas e três pessoas detidas – entre elas, o jornalista do Movimento Xingu Vivo para Sempre, acusado de esbulho possessório. Segundo testemunhas, a PM usou spray de pimenta na ação. Na quarta, sem mandado de reintegração de posse, as polícias Civil e Militar usaram balas de borracha e bombas de gás para despejar outros 350 ocupantes. 40 pessoas foram detidas e levadas à delegacia – entre elas, três menores de idade.
A ação policial foi violenta, de acordo com os sem-teto. “Eles chegaram com tudo, apontando arma na nossa cara”, diz um dos despejados. “Aproveitaram a hora do almoço e o fato de não ter nenhum canal de televisão aqui naquela hora”. Enquanto colhíamos estes depoimentos, era possível ouvir o som das bombas e tiros na área interna do terreno. Não era permitido à imprensa entrar para acompanhar a ação da PM.
“Se este terreno é da Eletronorte, por que a empresa não vem aqui dizer onde é que a gente vai ficar?”, questionou I., moradora da Invasão dos Padres, bairro que será atingido por alagamento. “A empresa vai botar o povo debaixo d’água. Se ela tem coragem de mandar expulsar a gente, como não tem coragem de enfrentar o povo, de dizer que a gente vai ficar no fundo? Igual em Tucuruí. Minha casa está até hoje no fundo lá e eu nunca recebi um real”, gritava para a imprensa uma das sem teto ocupantes. Sua mãe fora detida pela polícia.
Pressão imobiliária
Segundo a coordenadora do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, Antonia Melo, a cidade tem sofrido com o crescimento de ocupações urbanas e de populações sem teto desde que as licenças foram dadas. “A coisa havia piorado muito na cidade com a licença do canteiro de obras. Agora, com a licença de instalação de Belo Monte, a situação está beirando a calamidade pública”, argumenta.
A crescente bolha imobiliária e as incertezas sobre as indenizações das populações mais empobrecidas de Altamira vem carregando o clima e gerando êxodos espontâneos na cidade. De acordo com os sem-teto, a enxurrada de migrantes que chega a Altamira vem encarecendo os aluguéis até das palafitas, que, de cerca de R$ 80, chegam a mais de R$ 200. Sem poder arcar com os altos custos, antigos moradores das áreas mais pobres são obrigados a deixar suas casas.
Área em disputa
Apesar de ter sido identificada como de posse da Eletronorte pela polícia, posse da área ocupada pelos sem-teto é disputada por empresários da cidade.
Diretor da rádio e TV Vale do Xingu, grupo ligado ao político Domingos Juvenil (PMDB-PA), Miguel Ceci, foi à imprensa local reivindicar a posse do terreno e pedir que a polícia tomasse providências quanto à desocupação. No local, Ceci ameaçou ostensivamente os sem teto e agrediu um cinegrafista local com uma foice.
Outro elemento, identificado como Ubiratan que se dizia “amigo do proprietário”, intimidava os ocupantes e a imprensa, e discursava para os presentes responsabilizando o Bispo da Prelazia do Xingu como o causador dos problemas. “Vocês acham que uma pessoa de Deus teria sido ameaçado de morte? O Bispo é a besta-fera”, bradou para um grupo de homens que olhava a ocupação, próximo à sua caminhonete com placa de Macapá (AP).
No entanto, a versão oficial da posse da área veio com a PM e com o primeiro despejo sofrido pelas famílias. Após mais de 30 horas de ocupação, ainda na terça-feira, chegou ao local a Polícia Militar com um título de propriedade do terreno. Ali, argumentava-se que, em realidade, o terreno é da Eletronorte. O delegado garantiu aos moradores que o documento era legítimo, embora o papel que possuísse em mãos fosse apenas uma cópia gasta pelo tempo, o que não permitia uma análise. Também a polícia argumento se tratar de flagrante, embora os ocupantes estivessem lá há mais de um dia.
Amedrontados pelo contingente policial, os sem-teto pediram ao major da PM e ao delegado da Polícia Civil que aguardassem a presença da Defensoria Pública para mediar o conflito. No entanto, os militares entraram no terreno e removeram os sem teto antes que um defensor público pudesse chegar ao local. Todas as ferramentas de trabalho foram recolhidas pela PM e levadas para a Delegacia da cidade. Segundo participantes do ato, a Polícia Militar utilizou spray de pimenta depois que o território já havia sido desocupado e todas as famílias já haviam saído da propriedade.
Silêncio
“Todas estas cenas foram registradas in loco pela imprensa televisiva local. No entanto, por razões distintas, pouco ou quase nada dos fatos foram realmente para o ar”, lamenta a militante do Xingu Vivo Para Sempre, Samara, que acompanhou a desocupação. “O silêncio da mídia é o retrato do trabalho de coronelismo realizado pelo governo e pela Norte Energia em toda a região”, conclui.
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quem tem essa ex-querda, não precisa de inimigo de classe
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