Clarinha Glock [IPS/TerraViva]
A
indígena Sheyla Juruna chorou ao falar sobre a construção da Usina
Hidrelétrica de Belo Monte, no Xingu, norte do Brasil. Em meio a seus
“parentes” – como se refere aos demais representantes dos povos
indígenas reunidos na Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio+20. -,
ansiosa por participar das discussões, as lágrimas de Sheyla revelam sua
impotência diante das inúmeras tentativas feitas até agora de barrar a
obra.
“A minha alma chora, choro por tudo o que está acontecendo lá, porque
a vida do nosso povo está ameaçada. Acho que estas discussões são
importantes, mas enquanto o Governo Federal não se sensibilizar, parar a
obra, e buscar outras formas de energia, não vamos vencer”, reconheceu
Sheyla Juruna.
A construção da Usina de Belo Monte foi um tema recorrente na Cúpula
dos Povos durante as discussões sobre o tipo de desenvolvimento proposto
pelo governo brasileiro. Sheyla contou como os índios da região estão
se matando, envolvidos com violência, com alcoolismo, e como a cultura
vai se perdendo. Os integrantes do Movimento Xingu Vivo, que apoiam os
indígenas, explicam que a usina não vai afetar somente a população do
entorno, mas todos os que vivem do Rio Xingu, trazendo doenças e morte
para peixes e gente.
Sheyla não acredita mais que haja espaço para diálogo com o Governo.
“O Ministério Público leva para a Justiça, os juízes não fazem nada, a
gente está sendo abandonada. A obra está em andamento a todo vapor e as
questões sociais não estão sendo vistas. Estão calando a boca dos povos
indígenas com as migalhas. Até onde vamos com isso? “Agora, disse, é
partir para a briga, e com as próprias mãos, se for necessário”. No dia
15 de junho, os parentes de Sheyla fizeram um manifesto simbólico:
usando mãos, enxadas, furadeiras, cavaram as pedras e abriram
ensecadeiras – barragens provisórias que desviam o curso do rio para
permitir o trabalho em área seca durante a construção da barragem
definitiva – sob o escaldante sol da região amazônica. O rio voltou a
correr no seu fluxo.
“A vida é assim: a sociedade é democrática e as pessoas têm todo o
direito de protestar. Não reprimimos a manifestação”, disse Gilberto
Carvalho, secretário geral da Presidência da República, em entrevista à
agência Carta Maior depois do debate sobre “Democracia e Direitos”, na
Cúpula dos Povos. Carvalho negou que a construção da usina vai alagar
aldeias indígenas e prejudicar as populações locais. “Pelo contrário, há
duas áreas que estão sendo agora demarcadas por causa de Belo Monte”,
argumentou. “Somos privilegiados por termos recursos hídricos, o mundo
nos inveja. Não vamos transformar a riqueza hídrica num problema. Para o
padrão de desenvolvimento que precisamos ter para o Brasil, vamos
continuar construindo hidrelétricas; os erros cometidos na construção
destas usinas não podem anular a necessidade e a propriedade de
seguirmos construindo”, afirmou.
A placa de propaganda, no caminho para o Riocentro, local onde está
sendo realizada a Conferência Rio+20, assegura: Belo Monte tem segurança
e saúde garantidos. Mas a questão não é tão clara e segura quanto
anunciam. Em 1º de abril de 2011, a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos (CIDH) outorgou medidas cautelares a favor dos membros das
comunidades indígenas da bacia do Rio Xingu, no Pará. A justificativa
foi proteger a integridade pessoal e a vida destes beneficiários diante
do impacto da construção da Usina. Na ocasião, a CIDH solicitou ao
governo brasileiro que suspendesse imediatamente o processo de
licenciamento e impedisse a realização de qualquer obra até que fossem
observadas condições mínimas de respeito aos direitos daquelas pessoas.
Em 29 de julho de 2011, diante da resposta do Governo Federal, a CIDH
modificou o objeto da medida, amenizando os termos do pedido anterior,
mas reforçou novamente a preocupação com a garantia dos direitos dos
povos indígenas.
Uma fonte da CIDH confirmou a Terraviva a desconfiança de que o
posicionamento do Brasil a favor de mudanças na CIDH, ao se somar ao
grupo de países da Aliança Bolivariana das Américas (ALBA) durante a 42ª
Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) no início
do mês, na Bolívia, estaria ligada às restrições feitas pela relatoria
da CIDH sobre Belo Monte. Os países integrantes da ALBA, representados
pelo presidente do Equador, Rafael Correa, ameaçaram naquela ocasião
deixar a OEA caso não sejam tomadas medidas para sua renovação. Correa
argumentou que o sistema interamericano atua desvinculado dos governos
“democraticamente eleitos pelos povos da região”.
A assessoria de imprensa do Itamaraty, em Brasília, negou qualquer
relação direta. O assessor disse a TerraViva que a medida cautelar de
Belo Monte foi um exemplo usado pelo governo sobre a necessidade de
reformas no sistema interamericano, e, nesse sentido, “teve um peso”.
Mas reiterou que os estudos do Brasil sobre a necessidade de alterar a
forma de atuação da CIDH já vinham sendo realizados antes disso.
Para Sheyla e seus parentes, a Cúpula dos Povos foi o espaço que
restou para obter apoio e denunciar que a construção da usina de Belo
Monte, que não é sinônimo de desenvolvimento sustentável, e que as
populações locais estão sendo violadas e destruídas.
Por: Clarinha Glock
Fonte: IPS / TerraViva
"Em entrevista ao Valor, Sheyla Yakarepi Juruna, líder da aldeia Boa Vista KM 17, localiza na região, diz que todos os pedidos são justos e que é até pouco em face dos prejuízos que o empreendimento irá causar para o seu povo. “Até hoje o que fizeram foi dar migalhas para o nosso povo. O consórcio e o governo prometeram a ampliação da demarcação de nossa área, mas não fizeram nada. Ninguém está cumprindo com as condicionantes que assumiu”, comenta.
ResponderExcluirPerguntada sobre a necessidade de tantos carros para transporte, Yakarepi Juruna diz que será a única forma de os índios se locomoveram após a implantação da usina. “O rio vai ficar difícil de navegar em muita parte. É claro que a gente precisa dos carros”, argumenta". A lista tem gado, muitas camionetes, onibus, casas com eletricidade e Wi FI, aeroportos e mesada de 30 mil mensais. Pelo jeito o assunto é grana e preço, né? Ecologia é só o molho de um caldo asqueroso e mercenário. Que coisa...